No Rio de Janeiro, ultimamente, a incidência da pilhagem em lojas elegantes e grandes magazines cresceu, razão pela qual os repórteres se apresentaram naquela loja para fazer uma reportagem sobre o assunto.
Era uma loja que já tinha sido vítima de diversos roubos e o gerente estava mesmo disposto a contratar um detetive particular, para apanhar o ladrão em ação. Era — aliás — sobre esta disposição que o gerente falava com o repórter, enquanto o fotógrafo batia uma ou outra chapa da mercadoria exposta na loja. O gerente — como a Polícia — sabia direitinho como os ratos de loja funcionam. E se orgulhava de sua erudição a respeito.
— Você compreende — dizia ele ao repórter — a minha experiência levou-me a ser mais sabido do que a Polícia nesta questão — e fez um ar superior.
— Interessante — disse o repórter.
Sentindo-se com platéia, o gerente prosseguiu. Há o assalto boçal, do oportunista, que fica de olho, quando um caminhão da firma está descarregando mercadoria. Ao menor descuido, apanha um objeto qualquer e sai correndo. Mas este é o ladrão barato, sem estilo, e sem classe. A loja era vítima mais contumaz dos estilistas.
— Mas cada ladrão tem seu estilo? — estranhou o repórter.
— Claro — exclamou o gerente, tomando ares de professor.
Há o suposto freguês que entra, apanha uma mercadoria qualquer, como se fosse comprá-la, e leva-a a um dos caixeiros distraídos. Explica que comprara aquilo na véspera, mas que não ficara à seu gosto e desejava trocar. O caixeiro, ingenuamente, recebe a mercado¬ria e entrega ao ladrão, de mão-beijada, uma outra.
Há o que se aproveita dos momentos em que a loja está semi-vazia. Se o caixeiro está só, ele entra, escolhe o que vai comprar e que — de antemão — já sabe que está lá dentro. E quando o empregado vai lá dentro buscar o que o "freguês" deseja, este se apro¬veita e foge com outra mercadoria debaixo do braço.
O repórter anotou mais esta e o gerente contou outra. Para o roubo de objetos pequenos, que se costuma expor sobre os balcões, os ladrões preferem agir com valise de fundo falso.
— Como é isso? — quis saber o repórter, depois de pedir ao fotógrafo que batesse uma foto do gerente. Este posou napoleonicamente e explicou: — A valise de fundo falso é simples. Não tem fundo. O ladrão entra, coloca a valise sobre o objeto que deseja roubar. Quando levanta a valise o fundo falso já correu e deixou o objeto lá dentro, e ele o carrega consigo sem ser molestado.
Este processo, aliás, lembra um outro, dos que usam paletó frouxo, ou capa de chuva. Entram na loja e ficam examinando os mostruários. Quando notam que a oportunidade é boa, enfiam alguma coisa por dentro do paletó ou da capa. É um movimento rápido, difícil de ser pressentido pelos empregados.
— Puxa — admirou-se o repórter — mas existe uma infinidade de golpes, hein?
— E estes são os golpes dos ladrões que agem sozinhos. Há os ladrões que agem em grupo ou mesmo em dupla. Vem um, apanha uma porção de coisas como se fosse comprar e passa para o companheiro, que desaparece sem ser incomodado. Quando os empregados reparam que as mercadorias sumiram, o cínico limita-se a ordenar que o revistem.
— Impressionante — lascou o repórter, tomando os últimos apontamentos. E depois pediu: — Posso dar um telefonemazinho?
— Pois não — concordou o gerente. E mostrou onde era.
— Vem comigo, Raimundo — pediu o repórter ao fotógrafo e este, carregando as maletas das máquinas fotográficas, seguiu-o.
Passavam-se vários minutos e nem fotógrafo nem repórter volta¬vam lá de dentro. O gerente foi espiar e encontrou um bilhetinho perto do telefone, que dizia: "Meu Compadre: e o golpe de um fingir que é repórter enquanto o outro, fingindo que é fotógrafo, vai enchendo a mala com mercadorias à mão, o senhor conhecia?"
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Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto).
Fonte: O MELHOR DE STANISLAW - Crônicas Escolhidas - Seleção e organização de Valdemar Cavalcanti - Ilustrações de JAGUAR - 2.a edição - Rio - 1979 - Livraria José Olympio Editora
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