
Romancista francês, Honoré de Balzac nasceu em Tours em 20 de maio de 1799. Após estudos no colégio dos oratorianos em Vendôme, decidiu em Paris, por volta de 1818, dedicar-se apenas à literatura, contrariando o desejo da família, que queria vê-lo advogado.
A primeira peça que escreveu, Cromwell (1820), não chegou a ser encenada. Insistiu porém na escolha e continuou a escrever, preferindo agora a ficção, graças sobretudo ao estímulo de Laure de Berny, uma das muitas mulheres da alta sociedade que ao longo de sua vida prestaram-lhe apoio moral e financeiro.
Nos anos seguintes publicou, sob os pseudônimos de Lord R'Hoone e de Horace de Saint-Aubin, uma série de romances menores, posteriormente agrupados sob o título geral de Romans de jeunesse (Romances da juventude). Tais livros, embora se submetessem à moda dos folhetins e a influências diversas, já revelavam um incipiente talento.
A partir desse início, suas obras iriam suceder-se em velocidade espantosa: num período de vinte anos, Balzac publicou cerca de noventa romances e novelas, trinta contos e cinco peças de teatro. Paralelamente levou vida mundana, freqüentando os salões parisienses, viajando muito e procurando em vão um meio de enriquecer, objetivo que perseguiu pela vida ante o assédio permanente de seus credores.
De 1825 a 1828, sempre na expectativa de enriquecer, Balzac se lançou aos negócios: associou-se a um livreiro, comprou uma tipografia e se fez editor. Em 1829, após uma série de fracassos editoriais que acentuou suas dificuldades financeiras, conheceu enfim o sucesso com o primeiro romance que lançou com seu verdadeiro nome, Le Dernier Chouan (O último chouan), sendo "chouan" o nome dado aos insurrectos da Vendéia e da Bretanha em 1800.
Vislumbrou por essa época uma carreira política, esposando opiniões monarquistas e católicas. Em janeiro de 1833 principiou sua correspondência com a condessa polonesa Éveline Hanska, conhecida como l'Etrangère, que o admirava e com a qual se casaria mais tarde.
O fluxo criador de Balzac pode ser desdobrado em três etapas: a primeira, que se estende até 1829, foi um período de aprendizagem; a segunda, de 1834 a 1842, de consolidação de seu sistema novelístico; e a terceira, de 1842 a 1850, de unificação desse universo literário sob o título geral de La Comédie humaine (A comédia humana), alusivo à Divina comédia de Dante.
O êxito do primeiro romance foi confirmado nos anos que se seguiram por títulos como La Peau de chagrin (1831; A pele de onagro), Le Chef-d'oeuvre inconnu (1832; A obra-prima desconhecida), La Recherche de l'absolu (1832; A busca do absoluto), Eugénie Grandet (1833) e, sobretudo, Le Père Goriot (1834; O velho Goriot), onde começam a reaparecer personagens de livros anteriores, com o fim específico de conferir à obra encadeada o caráter global de espelho da sociedade francesa, em particular parisiense, na primeira metade do século XIX.
O mundo novelístico de Balzac é a primeira expressão coerente das potencialidades oferecidas pela revolução francesa e que então se concretizavam no plano social, econômico, político e individual, principalmente pelas transformações ocorridas na propriedade das terras, o que explica o interesse do romancista pela nova burguesia e pela decadência da aristocracia; o grande papel dos notários em sua obra; e a ausência da classe operária, que não participava desse processo.
O pano de fundo dos enredos são as estruturas e instituições advindas do império napoleônico e da irrupção dominante da burguesia. Paradoxalmente, foi o monarquista e legitimista Balzac quem revelou à Europa e ao mundo ocidental as conseqüências irreversíveis da revolução francesa.
Já nos romances da fase intermediária, que são a base de sua reputação, Balzac mostra obsessão pelos detalhes: seus heróis são seres de carne e osso que comem, bebem e se relacionam sob o domínio de paixões fortes. Deles se fica conhecendo exaustivamente o físico, o vestuário, o prestígio, a fortuna, a posição social e o domicílio.
A criação dos romances obedece a uma progressiva diversificação de situações, de personagens, de destinos humanos. Por suas qualidades, pela amplitude da área social tratada, pela técnica de que se vale o autor para a liberação das forças psicológicas nos personagens que movimenta, é forçoso admitir que, como gênero literário, a história do romance no Ocidente se divide em duas metades: antes e depois de Balzac.
Organização da "Comédia humana". A idéia de agrupar num todo a extensa obra narrativa, sob um só título genérico, levou tempo para ser posta em prática, embora fosse antiga nas cogitações do escritor. A primeira edição da Comédia humana, com o título escolhido por Balzac em 1842, começou a ser publicada, nesse mesmo ano, em 17 volumes.
Em 1845, para a segunda edição, foi adotado o plano, seguido pelas edições mais modernas. Nele, o agrupamento das obras obedece ao seguinte esquema: (1) Estudos de costumes no século XIX: (a) cenas da vida privada; (b) cenas da vida de província; (c) cenas da vida parisiense; (d) cenas da vida política; (e) cenas da vida militar; (f) cenas da vida rural. (2) Estudos filosóficos. (3) Estudos analíticos.
São inúmeras, nesses três grupos em que estão ordenadas, as obras-primas geradas pela fecundidade criadora de Balzac, como, além das já citadas, La Maison du chat qui pelote (1830; A casa do gato que brinca), La Bourse (1832; A bolsa de valores), La Femme de trente ans (1831-1834; A mulher de trinta anos), Illusions perdues (1843; Ilusões perdidas), Les Paysans (1845; Os camponeses).
Através dos vários romances da Comédia humana, conforme o rumo adotado desde Le Père Goriot, os personagens -- mais de dois mil ao todo -- aparecem e reaparecem segundo os vários níveis de suas vidas, num percurso contínuo que cobre todas as áreas sociais. A idéia central é que o dinheiro é o móvel fundamental da vida humana, sobrepondo-se sua busca a quaisquer outros interesses, sejam políticos, religiosos ou familiares.
Induzido pela voga científica da época, Balzac pretendeu aplicar às descrições de pessoas, com seus hábitos e sentimentos, seus ideais e paixões, o mesmo espírito analítico com que os cientistas descreviam os animais e as plantas. Foi o primeiro a reunir num ciclo de romances o estudo da vida social inteira, processo que seria seguido, entre outros, por Zola.
Em 1850, já gravemente enfermo, Balzac se casou com Éveline Hanska, e em 18 de agosto desse mesmo ano faleceu em Paris. A edição definitiva da Comédia humana, que saiu postumamente entre 1869 e 1876, constava de 137 romances, cinqüenta dos quais tinham ficado incompletos.
Fonte: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda.